o novo ano começou um pouco cinzento e com gotas de chuva.
algumas gotas de chuva caíram no parapeito da janela logo pela manhã do dia primeiro de janeiro do novo ano de 2014. gotas de chuva a desejar os bons dias e que continuaram a desejar nos dias a seguir. preciosas gotas de chuva. eu preciso de gotas de chuva para dar de beber aos meus sonhos e desejos e assim continuar a criar de todas as formas e feitios. mesmo que seja de pernas para o ar. mas a chuva que rega a cidade já cai em demasia. são vários os guarda-chuvas que se amontoam nas ruas da cidade. torcidos. quebrados pelo vento. deixados ali e acolá porque já não servem como dantes. o meu guarda chuva continua à janela. espreita os que passeiam pelas ruas. espreita os que são quase levados pelo vento.
já quase nem me lembro do primeiro dia de sol deste ano. esse dia de sol assinalado aqui na cidade onde vivo. lembro apenas que esteve assim poucos dias depois desse dia primeiro do ano. mas parece que já faz tanto tempo. já quase nem me lembro desse dia de sol. porque nesse dia de janeiro fez-se sol. mas já faz tanto tempo... há uns anos atrás janeiro foi todo ele solarengo e sei disso porque choveu apenas e só num único dia. por ter sido num dia de celebração especial para mim nunca esqueci que esse ano começou com sol e assim esteve durante todo o mês de janeiro. todo não. todo menos um. mas este ano tem sido muito diferente. quase sempre dias de chuva. mas nem sempre os dias de chuva são realmente dias de chuva. este ano é certo que o mês de janeiro foi muito bem regado, por isso podemos esperar que muita coisa floresça durante o ano.
Guarda - a - Chuva é a instalação que coloquei à janela durante o mês primeiro e que até dia 28 de fevereiro por aqui vai estar. quem passar nesta rua da cidade vai encontrar uma janela de chuva que significa esperança. um simples apontamento criativo para dar cor, luz e algum encanto à cidade e às pessoas que nela vivem e que até cá vêm passear... mesmo que venham passear em dias de chuva... não tarda nada vão-se transformar em dias de sol... assim esperamos que esses dias estejam para chegar.
nesta janela semeei algumas gotas de água. ao fazê-lo lembrei-me das pequenas gotas que habitam pequenas caixas que guardam histórias da chuva. pequenas caixas que criei para a Colecção “Histórias de Guardar a Chuva”, do projecto Água Musa que integrei em 2012 junto com outros 18 criadores e uma equipa de designers. um projecto desenvolvido com o apoio fundamental da ADXTUR.
semeando estas gotas de chuva nesta janela senti-me dentro de uma dessas caixas rodeada de um encanto que não existe apenas em histórias de encantar. encantos que encontro em simples dias... em momentos que são definidos grandiosamente por pequenos instantes. e eles também existam em dias de chuva.
“está a chover na tua casa” disseram-me pelo telefone por estes dias. “tens de colocar um apontamento novo à janela para ver se trazes o sol. já chove há dias a mais!” disseram-me também no outro dia.
às vezes junto-me à chuva mas hoje mesmo com chuva a cair do lado de fora da janela não choro como ela. mesmo com gotas de água suspensas nestas janela aqui dentro entrou o sol. os dias aqui dentro têm sido de sol. já se alinhavam com linhas desenhadas a grafite e com as agulhas de costura novos projectos. é bom mantermo-nos em movimento. do mesmo lugar podemos ir a tantos outros lugares... e este ano tenho vontade de fazer muitas coisas. vontade de agarrar com mais vontade ainda este desejo de criar. mesmo quando outros, por falta de esperança, tentam arrancar os sonhos daqueles que continuam a sonhar. aqui nascem ideias. aqui continuam a nascer ideias. nascem vontades de acontecer de diversas formas e feitios mesmo que sejam de pernas para o ar. este ano vou por tudo de pernas para o ar. e de pernas para o ar é como estou aliás à janela. nesta janela. a escultura de pano que desenvolvi em 2009 para o Prémio Nacional de Artesanato e que é um auto-retrato trimensionado com tecidos e linhas, já habitou tantos outros lugares mas até dia 28 de Fevereiro está aqui, nesta janela voltada para a cidade a qualquer hora do dia. um guarda-chuva que em tempos também já habitou outros lugares completa este cenário criado à janela. o momento em que do céu se recolhem algumas gotas de chuva. Guarda - a - Chuva é um apelo ao simples e preciso verbo guardar. guardar o que de mais precioso temos em nós. guardar o que de mais precioso nos define. guardar o que de mais precioso podemos partilhar com os outros. o belo que existe em tantas coisas. o belo que se manifesta de tantas formas e feitios. o belo dos instantes que se definem pela grandiosidade de serem tão pequeninos.
este ano vou por tudo de pernas para o ar... e janeiro renova em mim o forte desejo de continuar...
by Vânia Kosta
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